quinta-feira, 23 de maio de 2013

Todo riso é reza
Todo livro é sagrado
Toda pedra é preciosa

E todo poeta é um vendedor de consolos plásticos

terça-feira, 21 de maio de 2013

Vejo, sinto, percebo, sei e sou, de modo que tudo é real. 

Aliso o plástico e sinto sua superfície deslizante, o papel, as funções pré-estabelecidas das coisas úteis e inuteis, sinto e ouço as moedas que balançam nos meus bolsos enquanto ando sob o sol que me circula e acaricia enquanto despeja minha sombra. Vejo e analiso o vai e vem das coisas e dos homens e tudo é demasiadamente compacto e pulsante, tudo são cores e sons, de modo que tudo é demasiadamente real, a buzina dos carros, o som que há fora e dentro de mim, as vitrines e a loucura estática das coisas, o cigarro e a fumaça na mão do motorista que aguarda o semáforo abrir, e em tudo há culpa, beleza e angustia. Erguem as mãos aos céus em louvor a nicotina, o açúcar, o álcool, o alumínio e a soda caustica. O suor escorre das têmporas do homem que caça o pão e o esquecimento de cada dia. E sei, por que dizem, dos milagres do mundo. Uma menina nasceu na Índia com 4 braços e 4 pernas. Um B 52 sub-sônico americano rasga os céus e dirige-se ao Oriente Médio. Aumenta a produção e o consumo de fluoxetina no mundo. ONU sugere dieta de insetos contra a fome. Em Israel descobriram uma piramide submarina. Britânicos começam evacuação da Líbia. Ocorreram 3 explosões solares em menos de 24 horas. Há 549.577 presidiários no país.... E há sobretudo em toda parte um eterno sussurrar de ventos e grandes nuvens, que talvez sejam os nossos mortos. E como tudo é milagre: uma senhora de óculos de graus de grandes lentes, lenço na cabeça, e rugas que lembram imagens do Grand Canyon capturadas a 500 metros de altitude pelo google earth, cujo rosto talvez seja o trecho desconhecido de um mundo repleto de raças, de guerras, e de credos, de injustiças e tardias redenções, embrulha peixes com o jornal de anteontem, onde uma das matérias fala sobre um homem de 35 anos que abriu-se para a morte pelos pulsos cortados. Uma outra, sem camisa exibe os seios murchos pelo paletó velho e sujo entreaberto, enquanto vocifera contra quem passa no terminal metropolitano "filho da puta", grita, enquanto pombas indecisas sobre o próximo passo, num momento de súbita espontaneidade levantam voo de curta distancia e pousam, e retomam a decidir com dificuldade o próximo passo. Um homem executa suas perversões sexuais planejadas durante a semana no trabalho, num comodo escuro, mas tem receio de que algum parente já falecido o esteja assistindo. Uma outra chora por amor na escadaria de um edifício, por onde a senhora com os peixes sobe, inabalável, ante o olhar de espanto e condolências de 5 sardinhas mortas, repletas de sentimento. Num poste o bêbado se agarra como quem agarra a própria vida, uma quantidade real e alarmante de sua bile começa a petrificar em sua calça e ao pé do poste, e sua função é servir de consolo para quem passa. O mundo acaba a todo instante e volta a se recompor no segundo seguinte. 
Uma criança em algum outro canto corre, e nos seus olhos tímidos contém o universo num malabarismo cósmico e seu segredo eletrônico silencioso, e ela sorri para quem compreende. E nesse momento há sempre um receio de que Deus se distraia. As tantas rotações da Terra fizeram o sol desbotar um pouco o mundo, mas minha alma encharca e permeia tudo como se fosse invisível... 

Nossos passos continuam a girar o planeta em espiral infinito adentro, e a realidade não tem grandes lapsos nem permissões para que isso seja maior ou menor do que é. 
Os primeiros átomos, as moléculas de hidrogênio e éter, nuvens de gás e pó, as primeiras estrelas, o Big Bang que explode ainda, e que um dia irá se apagar, o tempo, o espaço, as culturas, a história, uma folha ou uma bomba que cai, cada qual com o seu propósito, e a mecânica elementar da vida (e tudo é a vida), é compacta e absurda como os olhos de 5 sardinhas mortas embrulhadas no jornal de anteontem.

Vemos, sentimos, percebemos, sabemos e somos, de modo que tudo é real.

Mas quando a noite nos lembra que a vida dorme e a morte acorda, no desgaste dos corpos há um desbotar de cores, um abafar de vozes, e o drama de toda uma vida se recolhe como uma quieta implosão, como uma música que vai chegando ao fim, 
anunciando o perdão da matéria e o fim inevitável de tudo, e nos resta apenas esse rufar de tambores ao longe que vai desaparecendo aos poucos, que é o meu coração ligado a todos os corações, como uma rede neural de 7 bilhões de conexões pulsantes no córtex cerebral de um Deus que lentamente fecha seus olhos...  
De tal modo que tudo é um sonho.

Holograma

O holograma no conjunto geral talvez não consiga trazer a tona todo o sentido daquilo que ele buscar significar, mas dentro de um angulo certo, uma luz certa, um momento de equilibrio perfeito pode fazer com que todo o significante atravesse camada por camada, luz por luz, num acréscimo de sentidos que vão se acumulando num movimento estático, numa desprezivel particula de segundo, num espanto, num assombro súbito, numa epifania: rápida e carregada de razão e leveza, como um espirro, como uma concepção, como a morte.